segunda-feira, 27 de junho de 2011

CINEMA - a lâmina que corta, de Walter Filho




Cinema, do grego, é movimento. Digamos, fotografia em movimento. Surgido na França do final do século XIX, precisamente em 1895, veio revolucionar o conceito de arte e o mundo da indústria cultural, porque nasceu já na era da reprodutibilidade técnica.

Em 1911, o italiano Ricciotto Canudo, em seu Manifesto das Sete Artes, denominou-o de sétima arte, pela capacidade de agregar a ela todas as outras. O cinema, entretanto, ultrapassou o simples registro de imagens e som e fez-se comunicação, mídia.

Walter Filho, cinéfilo confesso, com seu múltiplo olhar – já que teve a oportunidade de atuar como ator e diretor - guarda o promotor de Justiça do Ministério Público do Ceará e se posiciona sobre muitos dos filmes a que assistiu. A vida, grande cenário do incognoscível e pano de fundo de toda produção artística, transfigurada nas telas, seduz-lhe os olhos e o pensamento.

A paixão pela arte cênica é flagrante no autor de "Cinema – A lâmina que corta" (LCR, 2010), livro que é uma declaração clara de que ele não apenas contempla os filmes, mas os apreende na essência, vive-os com a alma desarmada, embora com o olhar arguto do crítico, coisa difícil de conciliar.

O projeto gráfico de Geraldo Jesuíno, com ilustrações dele, de Fernando Lima e de Harley Maquiavel, emoldura cinquenta e oito resenhas de cinquenta e oito filmes marcantes e, com a benesse do papel couche, dá ao leitor ainda maior prazer estético à leitura.

Os textos, escritos em linguagem simples e objetiva, incitam a descoberta de novas películas e ratificam a qualidade das já vistas. Sem nenhum objetivo técnico, mas, tão-somente o de fomentar e partilhar sua paixão pela telona, Walter comenta filmes como: '2001: Uma odisseia no espaço', 'Rastros do ódio', 'O jardineiro fiel', 'Camille Claudel', 'Rainha Margot', 'Katyn', 'Laranja Mecânica', a trilogia 'O Poderoso Chefão', 'O Evangelho Segundo São Mateus', 'O último tango em Paris)’, ‘O Leitor’, ‘O paciente inglês’, 'A Face Oculta', 'Corpos Ardentes', 'Batismo de Sangue', 'O Piano', 'Giordano Bruno', entre outros grandes títulos, dando ao leitor a oportunidade de avaliar sua análise e formar uma opinião própria. Não é sua intenção dar veredictos, até porque sua consciência intelectual acerca do assunto não permite julgamentos precipitados; ele diz claramente que é necessário, muitas vezes, o crivo do tempo para que um filme pereça ou permaneça em julgamento positivo.

Sua posição sobre a postura de determinados críticos se evidencia quando fala de 'Bonnie e Clyde – Uma rajada de balas' (1967), filme arrasado na época do lançamento. Na resenha a ele dedicada, resgata seu valor e afirma: “Um filme deve marcar pelo que representa para o espectador e não pela visão de alguns críticos, pois muitos são frustrados, e ficam soltando seus venenos contra trabalhos memoráveis” (p. 61).

De fato, suas resenhas não instigam ódio ou fazem apologias. Se não há imparcialidade total, até porque ao escolher, entre tantos, 58 filmes para resenhar, já se utilizou algum critério seletivo, também não há pareceres elogiosos. O tributo a Marlon Brando é justificado. Sem preconceitos de estilo ou diretores, ele aborda títulos de Ridley Scott, Stanley Kubrick, Marlon Brando, Valerio Zurlini, Patrice Chéreau, Wolgang Becker, Francis Ford Coppola, Denys Arcand, Helvécio Ratton, Win Wenders, Bruno Nuytten, Joe Wrigth, Alfred Hitchcock, Pedro Almodóvar, Woody Allen, Pasolini e Brian De Palma, fazendo uma passeio temporal e espacial que garante uma visão ampla da produção cinematográfica dos séculos XX e XXI, de vários países, garantindo, assim, a validade da amostra.

Dimas Macedo, no prefácio da obra, adverte: “se o leitor desejar encontrar aqui uma orientação de leitura para olhar a história do cinema a partir de um ponto de vista ideológico, eu peço que ele abra este livro colocando todo o preconceito no lixo. Para Walter Filho, cinema não é apenas sinônimo de prazer. É antes um corte que se arma contra a imbecilidade e a grande cegueira que nos torna, a cada dia, mais embrutecidos”. De fato, Walter não faz crítica no sentido de rotular o bom e o ruim ou levantar bandeiras.

Na verdade, demonstra o ecletismo do seu gosto ao traçar um panorama dos filmes marcantes a que teve acesso, situando o leitor no enredo e comentando a atuação dos atores e diretores, sem intelectualização, com a segurança do domínio da linguagem e do Mise-en-scène da arte que cultua. O livro é, pois, um acervo precioso do que melhor se fez no cinema mundial nos últimos séculos, por isso sua leitura é imprescindível aos amantes da sétima arte.



Aíla Sampaio