quinta-feira, 10 de julho de 2014

Explicações das Secas por Parte de um Perito




Vianney Mesquita*

Passam-se um, dois, seis meses venturosos, derivados da exuberância da terra, até que surdamente, imperceptivelmente, num ritmo maldito, se despeguem, a pouco e pouco, e caiam as folhas, as flores, e a seca se desenhe outra vez nas ramagens mortas das árvores decíduas. (Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha. Cantagalo-RJ, 20.01.1866; Cantagalo-RJ, 20.01.1866; Rio de Janeiro, 15.08.1909).


Uma vez aportado junho ao Ceará, em ano hídrico escasso, porém melhor do que a quadra invernosa passada (2013), parece induvidoso o fato de haver sumido a possibilidade da ocorrência de chuvas, no âmbito do período demarcado, cum grano salis, para este fenômeno natural, ainda de insuficiente império e controlo da ciência.
 Pelo menos, compete exprimir, malgrado na qualidade de hóspede em relação ao tema, a noção de serem inimagináveis, no tempo presente, precipitações em massa considerável, ao ponto de preencher os claros dos lençóis freáticos, ainda sequiosos, e avolumar os receptáculos d’água abastecedores das cidades, para diferir, até o termo do corrente exercício pluviométrico, a paisagem verde urbana e a exuberância dos prados interioranos e litorâneos do Estado, sem referir a outros proveitos consequentes da invernia, na versão cearense.
Prescindível é referir, por manifesta e consabida, no tentame de aduzir mais explicações, a ideia de ser este um assunto de relevância, inserto no âmbito do saber ordenado. Importa, contudo, evidenciar a conceição de que, consoante expresso do primeiro parágrafo deste escrito, não apenas o senso comum desconhece os enredamentos temáticos da Meteorologia, ramo científico a reboque dos humores da Natureza, pois também as teorias, a maioria das quais comprovadas, bem como os operários e equipamentos da mais moderna tecnologia, soem, recorrentemente, ser tapeados pelas filigranas e ludibrios da Mãe-Terra.
Eis que esta, pois, em conluio com outros sistemas galácticos, cujos movimentos internos interferem geofisicamente nos motos terreais (gravidade, magnetismo, sismicidade, fenômenos elétricos etc), como por capricho improviso ou veneta subitânea, desdiz, renega e não sanciona, em muitos momentos, as previsões, sempre louvadas em exitosos experimentos laboratoriais sucedidos em inumeráveis ocasiões.
Daí por que, no momento asado pelo possível cessamento da estação invernal de 2014, topei, para ler, o volume Seca: visão dinâmica, integrada e correlações, do professor Caio Lóssio Botelho, de quem fui escolar, na disciplina Geografia, nos anos 1960, quando cursava a então Escola Industrial de Fortaleza, hoje – após haver tomado no curso do tempo algumas outras denominações - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará.
Avezara-me, então, à velha e conhecida decoreba, imposta pelo desordenado sistema de ensino da época, para o qual o bom estudante era aquele cuja lição tomada era sabida “na ponta da língua”, decorada e de salto, contudo, sem nenhum cuidado relativo à absorção dos conteúdos.
Ocorreu, com efeito, a prima vez que pude conjeturar o vínculo horizontal e dialógico dos diversos ramos do saber ordenado, sempre que o Professor Botelho trazia à colação, em suas substanciosas preleções, as estreitas relações da Ciência de Estrabão de Amasia com as distintas vertentes disciplinares, à maneira como também procediam as estimadas mestras de então – Laysce Severiano Bonfim, Adelba Montenegro de Carvalho e Maria Augusta Gadelha de Alencar Araripe – em História, Língua Portuguesa e Matemática.
Mais adiante, afora engano, em 1988, ocorreu a mim a oportunidade de proceder, no ato de lançamento do livro do Professor Botelho, intitulado A Filosofia e o Processo Evolutivo da Geografia, à apresentação desse compêndio, didático por excelência e que delineia, com elevada intensão analítica, as conexões e dependências do mais importante conhecimento corológico em relação ao saber das primeiras causas.
Eu e ele, ambos como objetos – no entanto, principalmente, sujeitos – de lida buliçosa e até convulsa de uma urbe moderna, usamos de ser intermitentes nas ligações culturais e profissionais, porém, de quando em vez, por ofício ou contingência, surde o lance de sustentar conversas, concertar opiniões e consertar ideias, como também de evocar tempos de fausto e indigência neste terreno sempre movediço de culto às coisas do espírito.
Folgo, pois, após tantos anos, com escrever este comentário, tendo por escopo o livro Seca: visão dinâmica integrada e correlações, assunto no qual o Professor Caio Lóssio Botelho era especialista inconteste (já não escreve, acometido de Mal de Alzheimer), autoridade de referência derradeira, hajam vistas o considerável volume de consulentes que assistia, nomeadamente nos media da Fortaleza, que o procuravam constantemente para ratificar, retificar ou desafiançar afirmações correntes sobre secas, desenredando controvérsias, no mesmo instante em que transferia, com clareza, para o receptor a verdadeira dimensão dos fatos, sem retirar os pés dos estribos da Ciência que sempre dominou no seu tempo de vida hígida.
Esta é mais uma peça de essência agregada à farta produção desse mestre na seara prolígera da Ciência de Humbolt e ramos disciplinares afins, a enriquecer a bibliografia especializada e mais nobilitar a inteligência coestaduana, já tão bem representada pelos seus autores em multíplices conhecimentos, em meio aos quais se destaca o Professor Caio Lóssio Botelho na fração de saber por ele escolhida para esquadrinhar.






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